segunda-feira, 8 de novembro de 2010

A origem das espécies - Il Luogo di Aimo e Nadia, Milão

Num local improvável e fora de circuito há uma das jóias mais queridas de Milão. O ambiente não encanta: as paredes brancas sem ornamentos, o teto com tratamento acústico pontiagudo, e quadros (de gosto duvidoso) pelas paredes trazem certa frieza. Lá, o que brilha é a comida e o largo sorriso dos comensais.

A proposta é clara: escolher o melhor ingrediente e tirar o máximo de seu sabor. Jamais vi um lugar tão obcecado por divulgar a origem de cada um de seus produtos. A seriedade na escolha dos fornecedores faz do Luogo di Aimo e Nadia um dos melhores restaurantes da cidade, há mais de 40 anos.

Aimo circula pelo salão explicando a todos os clientes a procedência e importância de seus pratos, ressaltando detalhes como: “Os meus pães não têm fermento ou aditivos químicos. Faço questão de sová-los pessoalmente”. Absolutamente encantador.

Além dos pratos do cardápio, havia 2 tipos de menu degustação: um “criativo” e um clássico. Fomos no clássico, que começava com uma seqüência de entradinhas:

Um copinho com “crus” da Sicília (Pantelleria) e Puglia, que consiste de tomates sem nenhuma acidez,cubinhos de pão no fundo, azeite extra-virgem e ricota.

Um pão preto com pasta de azeitonas que encanta pela simplicidade e também um cannoli crocante recheado com ricota, tomates e anchova. Excelente.

Aí a estória fica séria...

Mergulhamos na gema cozida no vapor a 91 graus, coberta com lascas de cogumelos Porcini sobre abobrinha picada em crosta de pão e balsâmico. Os ovos são de Paolo Parisi, figura simpatissíssima, que merecia um post à parte. Ele alimenta suas mais de 1.200 galinhas com uma ração que inclui leite das cabras criadas na sua fazenda em Livorno, entre outros ingredientes. O resultado são ovos muito cremosos, com gema três vezes mais densa que o normal, de gosto amendoado.

Depois, patê de fígado de pombo e de pato, com creme de trufas brancas de Grazioli sobre brioche amarelinho. (Grazioli fornecia trufas em Milão desde 1930, numa pequena lojinha. Hoje abastece a centenária boutique Peck). E me pergunto por que nunca consigo fotografar antes de morder??

O simples e delicioso spaghetti da variedade Senatore Capelli (a melhor massa de grão duro da Itália, livre de pesticidas), com cebola picadinha, e pimenta calabresa. A casa oferece este prato há 40 anos.

Salmonete, trilha e lulas sobre purê de feijões brancos de Maremma (Toscana), louro e pó de manjericão.

Rabada de Carrù (uma comuna do Piemonte) cozida em Barolo Cappellano com purê de batatas tipo “bintia” feitas com manteiga do Alto Adige e lascas de trufa do Piemonte (ufa! notem como tudo aqui tem denominação de origem!) A rabada é cozida por 3 horas, a baixa temperatura. Divina.

E, como se não bastasse, uma espetacular sopa de caqui com biscoitos de amêndoa intercalados com creme de castanhas e ricota. Definitivamente, a melhor sobremesa de toda a viagem.


Moral da estória: ressaltar o sabor de um grande ingrediente não requer malabarismos. Receitas simples e muito amor (ou seria Aimo?) fazem 40 anos de sucesso.
IL LUOGO DI AIMO E NADIA
http://www.aimoenadia.com/
Via Montecuccoli, 6 - Milão
fechado aos sábados no almoço e aos domingos
39.02.416886

2 comentários:

  1. Tentei não comentar a resenha, mas não consegui. Impossível. Gema cozida, patê, spaghetti...tudo de bom. Mas finalizar a orgia gastronômica com aquela rabada (com manteiga e trufas) é realmente uma covardia. Parabéns pelo texto impecável e pelas fotos. Aliás, bela a foto do brinde a Baco da resenha anterior. Em sua homenagem a coroa de ouro com que o deus do vinho presenteou Ariadne. Tim-tim.

    ResponderExcluir
  2. O Sassicaia 88 foi aqui entao... uau! Acompanhamento mais que nobre!

    ResponderExcluir